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A volta da inflação ao patamar dos dois dígitos fez a defasagem histórica da tabela do Imposto de Renda (IR) dar um salto e alcançar 72,2% nos últimos vinte anos. Até 2014, essa discrepância era de 64,3% – é o maior avanço anual em uma década, o que representa uma carga tributária maior para os brasileiros, mesmo sem as alíquotas terem sido elevadas.
Isso ocorre porque, entre 1996 e 2015, a inflação (260,9%) foi muito superior à correção realizada pelo governo nas faixas de cobrança do IR (109,6%), segundo cálculos do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional). Nesse período, apenas cinco reajustes da tabela superaram o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
No ano passado, essa diferença ganhou ainda mais força, já que o IPCA chegou a 10,67%, o maior patamar desde 2002, enquanto o reajuste médio da tabela foi de apenas 5,6%.
Esse descompasso afeta sobretudo os mais pobres, já que vai trazendo pessoas com salários cada vez menores para dentro da base de contribuição. De acordo com a consultoria EY (antiga Ernst & Young), a isenção do tributo beneficiava quem recebia até oito salários mínimos em 1996 – relação que despencou para 2,41 em 2015.
“A correção da tabela de acordo com índices que reponham a perda do valor da moeda é um direito constitucional”, afirma o presidente da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho. Atualmente, a entidade tem dois processos sobre o tema correndo no Supremo Tribunal Federal. Um, sob relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, pede que a tabela seja corrigida pelo IPCA. Outro, nas mãos da ministra Rosa Weber, quer que, assim como a saúde, os gastos com educação sejam integralmente dedutíveis.
Esse “achatamento” da faixa de isenção também se deve aos aumentos acima da inflação aplicados ao salário mínimo nos últimos anos. Em 2015, houve um reajuste de 8,8% no piso nacional das remunerações, ante uma correção média de 5,6% do IR (os reajustes foram escalonados entre 6,5% e 4,5%).
“Tem um universo de trabalhadores que ganha entre 2,5 e 4 salários mínimos e que só paga Imposto de Renda devido à falta de correção da tabela”, destaca Gustavo Inácio de Morais, professor da PUC-RS. Caso houvesse uma correção integral pelo IPCA, a faixa de imunidade saltaria de R$ 1.903 para R$ 3.250,38. Ou seja, beneficiaria quem ganha até 4,1 salários.
Já em 2016, a alta das remunerações foi de 11,6%, ante correção ainda incerta do IR. “O reajuste deveria ter sido definido no ano passado, mas não houve qualquer sinalização do governo”, afirma o presidente do Sindifisco, Cláudio Damasceno.
A defasagem também faz com que a classe média entregue uma fatia maior da renda aos cofres públicos. Simulação realizada pelo Sindifisco mostra que uma pessoa com renda tributável mensal de R$ 4 mil paga hoje R$ 263,87, mas recolheria R$ 57,15 caso a tabela fosse totalmente corrigida. Ou seja, o montante pago é 361,7% superior. Já um trabalhador com renda mensal de R$ 10 mil tem um “prejuízo” menor: paga um IR 48,5% maior do que deveria.