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O Projeto de Lei 2.925, de 2023, tem como objetivo reformar o sistema de enforcement privado do Direito Societário brasileiro. O enforcement privado está conectado à aplicação de normas e ao exercício de direitos privados, sem a intervenção direta do Estado ou de órgãos públicos. Especificamente no Direito Societário, envolve mecanismos que permitem que os sócios, acionistas e demais partes interessadas façam valer seus direitos e obrigações, sem necessariamente recorrer ao Poder Judiciário ou a agências reguladoras e afins.
O PL 2.925 visa alterar a Lei nº 6.385, de 7 de dezembro de 1976, que regulamenta o mercado de valores mobiliários e cria a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e, ainda, alterar a Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que trata das sociedades anônimas. Seu objetivo é dispor sobre a transparência em processos arbitrais e o sistema de tutela privada de direitos de investidores do mercado de valores mobiliários.
Os processos arbitrais têm sido amplamente utilizados no Direito Societário por que trazem vantagens em relação à judicialização das disputas societárias. Entre estas, estão rapidez na resolução dos conflitos; especialização dos árbitros escolhidos pelas partes (o que é crucial, já que o tema societário envolve questões técnicas e complexas específicas dessa área do Direito); confidencialidade; autonomia das partes, na medida em que as partes tem liberdade de escolher as regras processuais, local da arbitragem e até mesmo os árbitros; exequibilidade das decisões (uma vez que as sentenças arbitrais têm o mesmo peso que uma decisão judicial, sendo definitivas e podendo ser executadas judicialmente, o que dá maior segurança jurídica para as partes); menor formalismo; etc.
Porém, algumas dificuldades puderam ser percebidas nos processos arbitrais, o que faz com que o PL venha em boa hora. Alguns destes desafios incluem a menor acessibilidade e custos elevados. A arbitragem, embora mais rápida, costuma ser mais cara que os processos judiciais. Taxas de arbitragem, honorários de árbitros e custos administrativos elevados dificultam o acesso para acionistas minoritários e pequenas empresas. O projeto visa criar mecanismos que possam tornar o processo mais acessível, inclusive para acionistas minoritários, e propõe regulamentar melhor questões de honorários e custos.
Outra dificuldade atual é a falta de transparência. Um dos principais atrativos da arbitragem é a confidencialidade, mas essa característica também pode ser problemática em disputas societárias que envolvem grandes empresas de capital aberto. Há críticas no sentido de que, em casos envolvendo interesses públicos, por exemplo, a falta de transparência pode prejudicar os acionistas minoritários e o mercado. O PL sugere que, em casos de empresas de capital aberto, certos elementos da arbitragem sejam tornados públicos para garantir maior transparência e proteger os interesses de todos os acionistas.
Outro problema importante refere-se à participação dos acionistas minoritários. Em algumas arbitragens, os minoritários têm dificuldade em participar adequadamente do processo, ou por falta de recursos ou por falta de acesso às informações necessárias para defender seus interesses, o que gera desequilíbrio de poder entre os acionistas majoritários e os minoritários. O projeto propõe medidas para proteger melhor os acionistas minoritários, para garantir sua participação efetiva no processo arbitral, inclusive com representação coletiva em certos casos.
Há ainda várias outras questões que visam ser solucionadas pelo projeto de lei, como as questões de legitimidade e recorribilidade, a escolha de árbitros, o impacto das decisões arbitrais em terceiros, a arbitragem em empresas de capital aberto e a execução de decisões arbitrais. Enfim, a proposta está vindo em boa hora para aprimorar o uso da arbitragem no Direito Societário, resolvendo questões importantes para que esse processo seja efetivamente útil e sirva aos interessados de forma equitativa, eficiente e ajustada às necessidades e especificidades das empresas brasileiras.
Tornar o processo arbitral mais acessível, transparente e equânime evitará demandas excessivas e desnecessárias no Poder Judiciário e processos inacessíveis aos acionistas minoritários. O crescimento do mercado brasileiro, dentre outros pontos, também depende de que os investidores, que se tornarão acionistas minoritários, confiem no sistema e possam nele se apoiar. Esse tipo de segurança permitirá maior crescimento ao mercado brasileiro.
As alterações propostas pelo projeto virão a impactar positivamente o ambiente de negócios brasileiros na medida em que a segurança jurídica encoraja os investidores a colocarem seus capitais nas grandes empresas e nas empresas de capital aberto, fomentando o mercado.
*Izabela Rücker Curi é advogada, sócia fundadora do Rücker Curi - Advocacia e Consultoria Jurídica e da Smart Law, startup focada em soluções jurídicas personalizadas para o cliente corporativo. Atuante como conselheira de administração, certificada pelo IBGC.